BREVES MEDITAÇÕES ACERCA DOS SETE DONS DO DIVINO ESPÍRITO SANTO
(I) SABEDORIA
1. Dentre os dons do Espírito Santo - que recebemos no Batismo e que com a Crisma sofrem uma espécie de upgrade - o primeiro deles é a Sabedoria. Ela se manifesta principalmente na capacidade de saborear as coisas sagradas. O saborear a vida de oração, a beleza da arte sacra, a virtude. E assim, com o paladar apurado pelos manjares do céu, seremos capazes de desprezar as lavagens da terra.
2. O leitor já deve ter notado que existem almas que não suportam pensar no céu, que não são capazes de longas orações, a que todo e qualquer sacrifício lhes é pesado, que são incapazes de bom gosto, de saborear a boa arte, de meditar nas verdades da fé. Falta-lhes sabedoria e, sem esta sabedoria, com o coração preso na terra, agem como estultos.
3. O princípio da sabedoria é o temor de Deus. É preciso considerar o poder de Deus que pode nos castigar em vida e precipitar no inferno após a morte. Somente assim iremos adquirir a dimensão da gravidade de nossos atos e a força para dar o passo inicial nessa jornada em busca das realidades celestes.
4. Em suma, a Sabedoria é o gosto pelo sagrado acompanhado do desprezo pelo profano, uma configuração interna d'alma que modifica completamente nossa conduta, a marca que difere os santos - e aspirantes a santidade - dos mundanos.
(II) INTELIGÊNCIA
5. A ciência da cruz é escândalo para os judeus e loucura para os pagãos. As verdades da religião, por mais que sejam diariamente proclamadas na liturgia e esmiuçadas pelos santos, são para tantos incompreensíveis. Mesmo após anos e anos escutando pregações e lendo a escritura, há tantas e tantas dúvidas. Dúvidas tamanhas que há aqueles que desistem ''-Melhor não ler a Bíblia, e só obedecer cegamente a autoridade'' é o raciocínio dos preguiçosos. Por mais que a autoridade visível tenha sua função no plano da salvação, Deus não dispensa os fiéis do trabalho de examinar e procurar compreender sua doutrina, e para tal lhes infunde no batismo o dom da inteligência.
6. Que é o Dom da Inteligência? É uma potência sobrenatural infundida no batismo que dá ao homem a capacidade de entender os mistérios da religião, penetrar em seu sentido último.
7. Ao longo da história da Igreja vemos tantos santos rudes, analfabetos, que contudo mostraram uma inteligência e conhecimento dos mistérios sagrados tanto maior que os dos mais renomados teólogos.
8. Muitos procuram a manifestação do Espírito Santo nas paixões, nos sentimentos, em algum tipo de intuição obscura. Tanto que fazem do centro de sua espiritualidade o pronunciar palavras incompreensíveis. Mas, no mais das vezes, o Espírito Santo age iluminando o entendimento. Alguém tem dúvidas de que Santo Tomás de Aquino e Santo Agostinho eram homens repletos da graça divina e iluminados pelo Espírito Santo? Como o Paráclito agia neles? Com arrepios no coração, intuições sem explicação ou, ao contrário, dando-lhes a inteligência para compreender a ação divina?
(III) CONSELHO
9. Se os dons anteriores - sabedora e inteligência - são dados, inicialmente, para benefício próprio, este terceiro é dado para o bem do próximo. Aquele que recebe o dom do conselho não o recebe para si, mas para outrem
10. Alguns podem vir a perguntar: "-Não são os mandamentos e a doutrina mais que o suficiente?" Acontece que os mandamentos e a doutrina são princípios gerais e a aplicação deste a circunstâncias específicas nem sempre é muito clara. Além do quê, as almas são, pois, distintas: o que para uma pode ser um remédio, para outra um veneno. Um exemplo é o álcool: para certa espécie de homem o álcool é um veneno, um caminho ao vício e a embriaguez; para outro um salutar remédio que o torna mais sociável, ajuda a vencer a tristeza e estar mais próximo de nosso Senhor. Assim também o jogo, o cigarro...
11. Necessitamos de conselhos para a nossa saúde, então recorremos aos médicos. Não raro necessitamos de conselhos para a realização de atividades físicas, procuramos alguém que treina a mais tempo, algum veterano da academia. Necessitamos de conselhos para nossa vida financeira, procuramos ler os livros dos grandes investidores, conversar com amigos mais experientes. Ás vezes necessitamos de conselho quanto a religião, a uma dificuldade no trabalho, acerca de certa situação em nossa família...
12. Há uma tendência em fazer do conselheiro uma espécie de psicólogo, um cargo. Não é assim. Ele - o conselheiro - não existe para tutorar todas as nossas decisões como fossemos criancinhas incautas, bem como, nem sempre uma pessoa é a adequada para nos aconselhar em todas as situações. Às vezes recorremos a alguém uma ou duas vezes na vida, a outro umas três ou quatro e é o suficiente. Também quando nos pedem conselhos devemos ter esse desprendimento, dar a pessoa o que ela quer, conforme Deus venha a nos inspirar, e deixa-la ir. Que coisa feia é o conselheiro que pretende fazer do outro sua propriedade, que espera ansiosamente que volte afim de lhe dar o retorno dos resultados obtidos, afim de se envaidecer.
13. Também não é bom que tenhamos um único conselheiro, é oportuno ouvir opiniões divergentes e pesá-las na oração afim de discernir o melhor caminho.
Por falta de direção cai um povo; onde há muitos conselheiros, ali haverá salvação (Pr 11, 14)
14. Por fim ressalto que o conselho é um auxílio, não uma ordem. O conselheiro não deve decidir por ti, mas aclarar a situação para que tu possas tomar a decisão. Leve isso em conta também se acabar na situação de aconselhar a outrem...
(IV) FORTALEZA
15. Dos sete dons do Espírito, talvez o dom da Fortaleza seja o mais palpável. É fácil observá-lo na coragem inquebrantável dos mártires a suportar todo tipo de tortura, no senso de aventura dos missionários a partir para terras distantes e absolutamente desconhecidas. Ou mesmo em como muitos descem aos infernos, as mais profundas misérias humanas afim de erguer os irmãos, como São Damião Molokai que quis servir em uma colônia de leprosos. Vemos no espírito cruzado dos lusitanos, que durante oito séculos guerrearam contra os maometanos. Também na heroica coragem de um Marcel Lefebvre, que já ao fim da vida, sem deixar se abater pela doença e a velhice, suportou o peso de uma injusta excomunhão para defender a Tradição Católica.
16. Tal fortaleza não é obra dos homens, mas de Deus. É infundida nos corações pelo Divino Espírito. Contudo se pelo pecado o homem expulsar o Espírito, romper a conexão com a graça, acontece como no episódio de Sansão. Com seus cabelos cortados, ele perdeu toda sua força. Assim também, homens outrora fortes e valentes, uma vez que rompem a aliança com Deus, que perdem o estado de graça pelo pecado, podem vir a torna-se ratos covardes e fracos.
17. Vivemos em uma guerra espiritual e mais do que em outros tempos está mais do que claro que as instituições oficiais, que a sociedade, o mundo, estão sob o Sol de Satã. Tal como os antigos lusitanos estamos destinados a viver e morrer lutando numa guerra perpétua, numa cruzada de séculos contra a modernidade. Afim de não desanimarmos, não desertarmos de tal luta, precisamos clamar ao Espírito pelo dom da Fortaleza.
18. Na mitologia nórdica apenas os guerreiros valorosos poderiam gozar da companhia de Odin em Valhalla. Também a religião verdadeira reserva o céu tão somente aos mais valentes guerreiros, aqueles que resistiram até o sangue contra o pecado, aqueles que viveram para fazer guerra ao demônio, ao mundo e a carne. É preciso pois que sejamos soldados dignos do Senhor Deus dos Exércitos e nos armemos espiritualmente, afim de infernizar a vida dos demônios.
(V) CIÊNCIA
19. O dom da Ciência é uma espécie de olhar aguçado que permite ao homem encontrar a raiz de determinado problema. Na vida espiritual esse dom se manifesta sobretudo no discernimento dos espíritos, na capacidade de identificar e desmascarar os truques do demônio.
20. Também na vida intelectual o dom da ciência se manifesta de sobremaneira, o vemos manifesto, por exemplo, na Pascendi de São Pio X onde em meio ao labirinto de doutrinas e enganações dos modernistas o santo papa fora capaz de ver uma unidade no processo, rastrear o núcleo do problema.
21. Sem o dom da Ciência o homem não é capaz de identificar a causa de certos problema e, com um olhar míope e estreito, se limita a combater tão somente os sintomas. Vemos como a ausência desse dom torna vãos os esforços de muitos clérigos conservadores que embora travem combate contra a atual onda de erros e abusos no interior da Igreja, não se atentam a causa de tudo isso, a cloaca donde sai essa multidão de demônios, a saber: a rendição da Igreja a Revolução através do Concílio Vaticano II.
22. Se aos conservadores dentro da Igreja falta a ciência, que se dirá daqueles que estão fora dela? Tantos tolos pensam poder resolver os problemas do mundo com política, não tem Ciência, não conseguem discernir que a raiz do problema é religioso e não político: se Cristo não reina sob as nações, elas se tornam pastos dos demônios.
(VI) PIEDADE
23. O dom da Piedade consiste no zelo pelo correto cumprimento dos deveres da religião, ainda que faltem consolações externas.
24. Há almas que cumprem os deveres da religião com tanta má vontade que é como se não o fizessem. Rezam não com atenção, mas com pressa, atropelando as palavras sem se deter em seu significado. Vão a missa de qualquer jeito, sem atentar as vestimentas adequadas ou a correta postura exterior.
25. O dom da piedade tanto serve para nos dar perseverança no cumprimento de nossos deveres de religião, como para edificar os outros. Uma alma piedosa incendeia as demais, insulta a sua mediocridade, dá a dimensão da gravidade das coisas sagradas por seus atos externos, ainda que internamente esteja vivendo uma tempestade, uma noite escura. Ao contrário a alma pouco piedosa, por sua conduta externa relaxada, desanima os irmãos na prática da fé, os arrasta a mediocridade e abre brechas para que entre o demônio da Acídia.
26. Hoje mais do que nunca falta a piedade nos católicos: quantas devoções abandonadas, quantas missas mal celebradas, quantas cânticos mal compostos, igrejas feias e mal construídas, pregações rasas e medíocres.
27. A piedade é como que o óleo da lamparina, sem ela a chama da fé vai se apagando e pode chegar a desaparecer. É o óleo que faltou aos virgens imprudentes e as condenou as trevas exteriores.
28. Contudo, não podemos fabricar a piedade por nós mesmos. Como se trata de um dom do Espírito, devemos pedi-la em oração. Pedimos tanta coisa, mas esquecemos com frequência de pedir os dons espirituais, os dons do Divino Espírito Santo. Quanta tolice de nossa parte!
(VII) TEMOR
29. Por temor da miséria e da fome quantos homens não se põe ativos e criativos afim de custear o pão para si e para os seus? Por temor das leis do Estado (não raro tirânicas) muitos renunciam a liberdades legítimas desejosos a evitar confusão. Não poucos renunciam ao casamento por temor dessas mesmas leis estatais que hoje sufocam os homens. Ora, que efeitos e renúncias heroicas não produz na alma o santo temor de Deus?
30. Motivos para o temor não o faltam: Deus é infinitamente grande e terrivelmente poderoso. Vede a ira de Deus, como ele quase extinguiu a humanidade com o dilúvio, como fez chover fogo dos céus e pulverizou as cidades de Sodoma e Gomorra, como enviou seu Anjo Exterminador para punir os primogênitos do Egito depois de submeter aquela nação a pragas terríveis, como entregou os povos de Canaã ao espada dos israelitas.
31. E o que são os castigos temporais comparados as penas espirituais? Pensemos pois nas agonias terríveis do Purgatório, que apesar de longas e intensas ainda tem um fim. Pensemos agora nas torturas infinitas do inferno, onde as almas serão castigadas com aquilo que há de mais perturbador e confiadas aos mais cruéis carrascos - a saber: os próprios demônios - .
32. Não devemos, pois, cultivar o temor? O temor dos castigos temporais e das pensas eternas e de tal modo alterar nossa conduta para que não compartilhemos a sorte dos inimigos de Deus? O temos de Deus é o princípio de toda a sabedoria, que vale o homem ganhar o mundo se vir a perder a vida eterna? Temamos pois o inferno, a ira de Deus e teremos uma conduta sóbria neste mundo. Cultivemos uma atitude despreocupada e viveremos como estultos, tal estultice será causa de lamento por todos os séculos dos séculos. Quantas mil anos de sofrimento certa alma do purgatório não poderia ter evitado se realizasse uma mínima emenda ante certa conduta? Quão terríveis torturas se teria evitado um dos danados se tivesse meditado sobre a Ira de Deus?
33. Mas o homem de hoje tem medo de ter medo, temor de temer. Muitos ao pensar nessas coisas ficam ansiosos, acabrunhados, não conseguem descer ao inferno sequer em pensamento. É por isso que o Temor é um dos dons do Espírito Santo. É preciso certo carisma especial para meditarmos sobre isso, certa fibra espiritual para imaginar tais castigos. A falta desse dom leva a tantos teólogos a vomitarem um oceano de estupidez: "-Os demônios não existem, o inferno está vazio, Deus não castiga", temem temer e para escapar do medo se agarram a falsas esperanças, a heresias estúpidas, fazem-se pois néscios e estultos.
VENI CREATOR SPIRITUS


