Deus Todo Poderoso, que nos criou à Vossa imagem e nos indicou o caminho do bem, do verdadeiro e do belo, especialmente na pessoa divina de Vosso Filho Unigênito, Nosso Senhor Jesus Cristo, permiti-nos que, pela intercessão de Santo Isidoro, bispo e doutor, durante nossas navegações pela Internet, dirijamos nossas mãos e nossos olhos apenas àquelas coisas que Vos sejam aprazíveis e que tratemos com caridade e paciência todas aquelas almas que encontrarmos pelo caminho. Por Cristo Nosso Senhor. Amém.

sábado, 2 de novembro de 2024

Em defesa dessa fofinha


Tudo que o Vaticano fez foi encomendar um desenho e apresentá-lo numa conferência de imprensa. A internet cuidou de todo o resto: centenas de fanarts belas e criativas, memes e mais memes, criaram criptomoedas, animações, agora esculturas de impressora 3D (já providenciei a minha). Tudo de forma completamente descentralizada, não há diretório central, plano de burocratas, não há dinheiro globalista impulsionando campanhas de marketing, tão somente o entusiasmo e a espontaneidade das pessoas. Ainda que se possa especular intenções não muito ortodoxas por parte de algum clérigo ou do artista responsável, fato é que a personagem foi acolhida pela bolha otakucatólica e já saiu do controle de seus criadores, está junto das cibemilícias templárias numa cruzada cibernética contra o mundo moderno.

A capacidade de lidar de forma saudável com a cultura popular foi um dos diferenciais do catolicismo frente a chatice dos protestantes (há até mesmo um episódio dos Simpsons sobre isso kekekek), sobretudo na América Latina. Se no passado a cultura popular estava nos arraiais e sertões, nas festas juninas e na folia de reis, hoje ela foi digitalizada. A personagem Luce - bem como o rosário missionário que a acompanha – são, pois, excelentes ferramentas para a evangelização do Continente Nuvem e também para pensar a igreja pós-ocidental.

Talvez eu esteja indo rápido demais, irei retornar aos temas acima mencionados respondendo as principais objeções contra a personagem.

I. Infantilização da Fé

Argumentam alguns que apresentar a personagem em desenho animado em estilo de anime seria uma forma de infantilizar a fé e que isso seria condenável. Me perdoem a ironia mas: dançar fantasiado de caipira em volta de uma fogueira no meio de um monte de balãozinho colorido é muito adulto, né? Olha cobra!!! É mentira!!! Tanto menos adulto e sério o é usar roupas floridas e mascaras com penachos, dançando com espadinhas da madeira ao som de música sertaneja, ah, iah! E ainda assim tudo isso encontra seu lugar dentro da Igreja.

A questão é que existe a arte sacra e a arte meramente religiosa. A arte sacra é aquela que é própria do culto divino, da sagrada liturgia, uma arte refinada pela excelência e trabalhada segundo os mais finos padrões estéticos e teológicos. Contudo, paralela a arte sacra, sempre existiu uma arte meramente religiosa, popular, que trata de temas afins a religião, mas sem passar por tal processo de refinamento. Tais práticas mesclam a devoção com elementos mais lúdicos, danças e fantasias; no passado tivemos as Cantigas de Santa Maria (de Afonso X), as festas juninas, a folia de reis, as fitinhas do Senhor do Bom Fim, a árvore de Natal (a qual sua introdução em meios católicos é recente, a primeira árvore de Natal do Vaticano data de João Paulo II), hoje temos a Luce-chan.

Se é um erro trazer tais expressões populares ao centro da vida litúrgica, outro erro seria pretender condenar essa expressão popular extralitúrgica;  seria confinar a religião tão somente ao interior dos templos e mosteiros, privando-a de preciosos meios de evangelização popular.



II. O Artista

Outros argumentam que o artista que criou a personagem não seria nenhum santo, antes ao contrário: teria ideias tortas e relações com a cultura woke. Tal artista teria inserido referencias subliminares no desenho, a pomba branca com os ramos de oliveira, por exemplo, seria uma referência ao noahquismo. É um argumento válido, de fato é um incomodo pensar que dentre tantos devotos se tenha escolhido esse tipo de gente para elaborar a personagem, contudo, já ouviu falar de um sujeito chamado Michelangelo? De um outro tch0l4 chamado Caravaggio? No fim, algumas obras de arte ganham vida própria independente da intenção de seus criadores; tanto que o X está repleto de memes based da Luce-chan tocando fogo nos degenerados. 

Quanto aos elementos subliminares, bem, a capela sistina até hoje não foi demolida e nunca se condenou Dies Irae de Mozart. Algumas mensagens subliminares são tão bem escondidas que só intelectual chato percebe, a maioria das pessoas acaba fazendo o uso correto da arte e esquecendo (ou sequer percebendo) quaisquer intenções ocultas.

III. Cultura de Internet

A última objeção a qual pretendo responder neste artigo trata de uma suposta inferioridade da cultura da internet ante a cultura popular tradicional. De fato, existe tal inferioridade, assim como as culturas pagãs eram inferiores à cultura judaica. Contudo, quando do anúncio do Evangelho aos gentios, São Paulo demonstrou que não era necessário que este viesse acompanhado das práticas judaicas, era lícito aos conversos do paganismo desenvolver seus próprios costumes desde que estivessem em harmonia com a fé.

Para muitos são palavras difíceis de se engolir, uma vez que a cultura ocidental está como que se eclipsando; querem, pois, alistar os cristãos a luta pela preservação da mesma, arregimentar soldados para “salvar o Ocidente”. Não é necessário aos conversos dentre as gentes observar os costumes judaicos. Não é necessário aos católicos se tornarem reféns de um paradigma cultura extremamente específico de determinado onde e quando. O principal é que conservemos os dogmas da fé.

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Se ainda assim, caro leitor, você não foi convencido e alimenta hostilidade para com a Luce-chan, resta-me o argumento defintivo: Ok, boomer!